segunda-feira, 25 de maio de 2020

Platão – Um Alicerce da Filosofia Ocidental


Quem foi Platão?

Platão (427-347 a.C.) era ateniense e provinha de uma antiga família pertencente à nobreza da cidade. Seu nome verdadeiro era Arístocles, mas, devido a sua constituição física, recebeu o apelido de Platão, palavra grega que significa “de ombros largos”.
Foi discípulo de Sócrates, a quem considerava o mais sábio e o mais justo dos homens. Depois da morte de seu mestre, Platão empreendeu inúmeras viagens, período em que ampliou seus horizontes culturais e amadureceu suas reflexões filosóficas. Por volta de 387 a.C. retornou a Atenas, onde fundou sua própria escola filosófica, a Academia, nos jardins construídos por seu amigo Academus.


Dualismo platônico

Em sua doutrina, conhecida como teoria das ideias, Platão propôs uma ideia sobre o ser dualista. Para ele, existiriam duas realidades opostas:

                        - Mundo sensível: corresponde à matéria e compõe-se das coisas como as percebemos na vida cotidiana, isto é, pelas sensações, as quais surgem e desaparecem continuamente. Assim, as coisas e fatos do mundo sensível são temporárias, mutáveis e corruptíveis.

                        - Mundo inteligível: corresponde às ideias, que são sempre as mesmas para o intelecto, de tal maneira que nos permitem experimentar a dimensão do eterno, do imutável, do perfeito.
Por exemplo: quando você pensa um cavalo ele sempre é perfeito, pois está no mundo inteligível, mas quando você vê os cavalos eles não são perfeitos, pois estão no mundo sensível. O ser (cavalo) no mundo inteligível é perfeito, no mundo sensível é imperfeito.
O conhecimento, conforme Platão, para ser autêntico, deve ultrapassar a esfera das impressões sensoriais, o plano da opinião, e penetrar na esfera racional da sabedoria, o mundo das ideias. Para atingir esse mundo, o ser humano não pode ter apenas “amor às opiniões” (filodoxia); precisa possuir um “amor ao saber” (filosofia).

O método platônico

O método proposto por Platão para realizar a passagem da opinião ao saber e atingir o conhecimento autêntico (episteme) é a dialética. A dialética consiste basicamente na contraposição de uma opinião à crítica que podemos fazer dela, ou seja, a discussão e a negação de uma tese com o objetivo de purificá-la dos erros e equívocos permitindo chegar às ideias verdadeiras. Por exemplo: Pense na ideia que você tem de felicidade. Será que sua ideia é autêntica, verdadeira ou apenas uma opinião pessoal. Se você se dispor a conversar (dialogar) com alguém sobre esse assunto, possivelmente saíra do diálogo com um conhecimento mais amplo sobre a felicidade, porque o outro irá questionar suas opiniões e o fará avançar a um saber mais verdadeiro.
Platão dizia: “Se eu tenho uma moeda e você tem uma moeda e eu dou a minha moeda a você, você ficará com duas moedas e eu sem nenhuma; por outro lado, se eu tenho uma ideia e você tem uma ideia, e nós compartilhamos nossas ideias, cada um sairá com duas ideias”.


O Mito da Caverna

Platão criou em seus textos várias alegorias para expor suas doutrinas. A mais conhecida é o mito da caverna, o que nos ajuda a entender a evolução no processo do conhecimento.

O mito fala sobre prisioneiros (que desde o nascimento) vivem presos em correntes numa caverna e que passam todo tempo olhando para a parede do fundo que é iluminada pela luz gerada por uma fogueira. Nesta parede são projetadas sombras de estátuas representando pessoas, animais, plantas e objetos, mostrando cenas e situações do dia-a-dia. Os prisioneiros ficam dando nomes às imagens (sombras), analisando e julgando as situações.

Vamos imaginar que um dos prisioneiros fosse libertado das correntes para poder explorar o interior da caverna e o mundo externo. Entraria em contato com a realidade e perceberia que passou a vida toda analisando e julgando apenas imagens projetadas por estátuas. Ao sair da caverna e entrar em contato com o mundo real ficaria encantado com os seres de verdade, com a natureza, com os animais etc. Voltaria para a caverna para passar todo conhecimento adquirido fora da caverna para seus colegas ainda presos. Porém, seria ridicularizado ao contar tudo o que viu e sentiu, pois seus colegas só conseguem acreditar na realidade que enxergam na parede iluminada da caverna. Os prisioneiros vão chamá-lo de louco, ameaçando-o de morte caso não pare de falar daquelas ideias consideradas absurdas.


O que Platão quis dizer com o mito

Platão quis dizer que, para chegar ao conhecimento verdadeiro é preciso sair das opiniões do senso comum, refletir criticamente, e enxergar as coisas na sua essência, como verdadeiramente são. Isso é filosofar.
 Os seres humanos têm uma visão distorcida da realidade. No mito, os prisioneiros somos nós que enxergamos e acreditamos apenas em imagens criadas pela cultura, conceitos e informações que recebemos durante a vida. A caverna simboliza o mundo, pois nos apresenta imagens que não representam a realidade. Só é possível conhecer a realidade, quando nos libertamos destas influências culturais e sociais, ou seja, quando saímos da caverna.

Atividade para construir o aprendizado

1)  Resuma, em forma de tópicos, quem foi Platão.
2)  Descreva as duas realidades do ser propostas por Platão.
3) Como se chamava o método utilizado por Platão? Explique resumidamente.
4)  Como se chama a alegoria mais famosa de Platão? Resuma em poucas palavras.
5)  O que Platão pretendia dizer com a alegoria do mito da caverna? Sintetize.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHALITA, Gabriel. Vivendo a Filosofia. São Paulo: Atual, 2002.

COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. 4ªed. São Paulo: Saraiva, 2016.

Antropologia Filosófica – Uma reflexão sobre o ser humano


A condição animal como ponto inicial no processo de compreensão sobre o homem

Introdução

Este estudo tem como objetivo dar início à reflexão sobre os seres humanos, destacando a importância de admitir sua condição de animal dotado de um corpo que o aproxima e o distingue dos demais seres do planeta. Admitir essa aproximação e essa distinção requer esforço típico da reflexão filosófica, indubitavelmente necessária para a formação ética e para a construção da convivência humana solidária. Afinal, uma das perguntas centrais da Filosofia, colocada de início é exatamente: Quem somos nós, seres humanos? E ainda: Qual é a nossa condição de transformar o mundo em que vivemos em um lugar melhor?

Iniciaremos a reflexão proposta por aquilo que nosso olhar constata de imediato quando mira um ser humano e a si mesmo, ou seja, começaremos pela evidência de que temos um corpo. E esse corpo nos remete, antes de tudo, ao lugar dos animais. As primeiras perguntas em nossa reflexão filosófica são: Que espécie de animal nós somos? O que nos caracteriza? O que nos marca como animais da espécie humana?


O saber sobre o corpo

            Estamos no século XXI. E toda extraordinária evolução das ciências e das explicações racionais e detalhadas dos fenômenos que envolvem nossa existência nos colocam perante desafios como a interpretação do corpo humano e de suas práticas cotidianas. Mas será que sempre foi assim?

            Nas culturas primitivas, o indivíduo não tinha consciência de possuir um corpo que interage num mundo de corpos e objetos. Não havia reflexão sobre a individualidade, e, portanto, a corporeidade objetiva não era percebida em meio a um mundo de corpos e objetivos.


Concepções filosóficas sobre o corpo

            Com o início da atividade reflexiva, o homem toma contato com sua individualidade por meio da introspecção. Sócrates inaugura essa atividade, levando o homem a identificar-se e à sua posição diante dos outros. Quebra a unidade do ser, dividindo-o em corpo perecível e alma imortal.

            Com Platão, corpo e alma assumem posições contrárias, antagônicas: a alma é eterna, pura, sábia, ao passo que o corpo é mortal, impuro, degradante. O corpo é uma verdadeira prisão que impede a ascensão da alma ao plano ideal e perfeito.

            O cristianismo retoma a concepção dualista platônica, fazendo imperar uma visão de corpo corrupto, pecaminoso, um empecilho ao desenvolvimento da alma, uma verdadeira “pedra no meio do caminho”...

O Homem Vitruviano
            A Idade Moderna, com o advento da ciência experimental, inicia o estudo direto sobre o corpo como objeto de conhecimento, surgem a anatomia e a medicina científicas, que buscam as relações de causa e efeito inerentes ao funcionamento dessa “máquina orgânica”, como se convencionou chamar o corpo. No entanto, o corpo continuou dissociado da alma, jogado no lodo, ao passo que a alma era coroada como portadora da razão, da intelectualidade que tirava o homem da simples condição de animal.

            Para René Descartes, importante filósofo moderno, o homem constitui-se de duas substâncias: uma pensante, a alma, razão e sua existência, ao passo que a segunda substância, o corpo, é simplesmente uma res extensa, uma coisa extensa, que não tem nada em comum com a alma. A consciência e a reflexão filosófica situam-se no plano da alma, nada têm a ver com o corpo.


Os vitalistas

            No século XVIII, aparece uma corrente que se opõe ao mecanicismo – que compara o corpo a uma máquina – são os vitalistas. Diziam que o corpo não é uma máquina insensível, mas um ser dotado e sensibilidade, emoções, afeições. O princípio vital não é imortal, mas um conjunto de “forças que resistem à morte”.

            Por quase dois milênios o corpo foi, então, como que “uma pedra no meio do caminho” da existência do homem, sem que se percebesse que ele era a própria manifestação dessa existência. Mas, pouco a pouco, parece que o corpo foi sendo reabilitado. Lentamente tirado do lodo desprezível em que se encontrava, mas quase nunca chegando à igualdade de posição com a alma.


Concepção atual sobre o corpo

A busca pelo corpo perfeito
            Hoje parece que temos um homem um pouco mais preocupado com seu corpo, pois o caráter materialista de nossa civilização ensina que devemos nos preocupar mais com essa vida mundana presente. Mas essa preocupação não e integral: por ter feito um pouco de ginástica pela manhã, o homem acha que seu corpo já está em “forma”, e sobrecarrega-o no restante do dia, alimenta-se mal, abandona o corpo, limitando-se a “rolar a pedra pelo caminho” em direção ao pôr do sol de sua existência.

            Na busca de uma beleza impossível, porque fabricada pela propaganda, ficamos mais feios e perdemos a saúde. A filosofia procura nos mostrar que outra deve ser a relação que devemos ter com o corpo, e qual sua importância em nossas vidas. O corpo humano é o corpo que sente, percebe, fala, chama a atenção para o corpo que somos e vivemos.

Questões para o estudo e a construção do pensamento:

1- Os seres humanos têm inicialmente uma condição de animal dotado de um corpo que o aproxima e o distingue dos demais seres do planeta. Escreva elementos que nos aproximam e elementos que nos distinguem dos outros animais.
     2- Como as concepções de Sócrates, Platão e cristã entenderam o corpo?
    3- Explique a concepção moderna que considera o corpo como uma “máquina orgânica” e compare com a concepção dos vitalistas.
     4- Como a sociedade atual entende o corpo? Existem padrões tidos como ideais de beleza? Escreva.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. 4ªed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 154-157.
Ética e Cidadania: Caminhos da Filosofia: Elementos para o ensino de filosofia/ Sílvio Gallo (coord.); 18ª ed. rev. e atualizada: Campinas, SP: Papirus, 2003. p. 62-67.
GALO, Sílvio. Ética e Cidadania: Caminhos da Filosofia. 18ªed. Campinas, SP: Papirus, 2010. p. 103-109.

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Todos os homens são “filósofos”


Introdução
O objetivo desta leitura é que compreendam, na perspectiva do filósofo italiano Antônio Gramsci, (1891-1937), em que sentido se pode afirmar que todos os homens são “filósofos”. Trata-se de mostrar que, de certo modo, a Filosofia está presente em nosso cotidiano (na linguagem, no senso comum, no bom senso, na religião, enfim, em todo o nosso sistema de crenças e opiniões), influenciando nosso modo de agir e pensar, mesmo que não tenhamos consciência disso. Com esse texto, você pode, também, explorar os conceitos de “senso comum” e “bom senso”, cuja compreensão será importante para a percepção do papel da Filosofia como meio de superação do senso comum.

Todos os homens são “filósofos”
Antonio Gramsci, um filósofo italiano do século passado, já alertava para a necessidade de se combater o preconceito muito difundido de que a Filosofia é uma atividade intelectual muito difícil e, por isso, restrita a uma minoria de inteligência supostamente privilegiada. Isso porque, para ele, em um certo sentido, “todos os homens são ‘filósofos’”, pois, de algum modo, todas as pessoas, sem distinção, independentemente de seu grau de escolaridade, lidam, convivem, trabalham com a Filosofia e a utilizam no seu dia a dia, mesmo que não se apercebam disso. Afinal, a Filosofia está presente “na linguagem, no senso comum, no bom senso, na religião”, enfim, “em todo sistema de crenças, superstições, opiniões, modos de ser e agir” que caracteriza o que somos.

A linguagem
A Filosofia está presente na linguagem porque esta não é pura e simplesmente um amontoado de “palavras gramaticalmente vazias de conteúdo”. Ao contrário, ela é um “conjunto de noções e conceitos determinados”, muitos dos quais derivados da Filosofia. Portanto, a Filosofia está presente na linguagem que utilizamos, mesmo que não tenhamos consciência disso. Daí por que, para Gramsci: “Linguagem significa também cultura e Filosofia.

                                                      O senso comum
O senso comum é o conjunto de valores, crenças, opiniões, preferências, que constitui a nossa visão de mundo e que orienta nossas ações e escolhas cotidianas. Em geral é assimilado acriticamente, sem qualquer questionamento. A exemplo do que acontece com a linguagem, muitos desses valores e crenças têm origem na Filosofia, mas nós os assimilamos espontaneamente, sem nos darmos conta de sua origem. Simplesmente pensamos e vivemos de uma determinada maneira, acreditamos em certo grupo de valores, defendemos alguma posição política, ideológica ou religiosa, e assim por diante, sem, no entanto, nos preocuparmos em fundamentar nossas opiniões. Ao contrário, contentamo-nos com argumentos superficiais, muitas vezes até inconsistentes ou contraditórios.

                                          O bom senso
O “bom senso”, por sua vez, “coincide com a Filosofia”. Enquanto o senso comum é acrítico, espontâneo, irrefletido, o bom senso implica refletir, tomar consciência de que os acontecimentos possuem uma dimensão racional e que, portanto, devem ser compreendidos e enfrentados também de forma racional, a fim de se obter uma orientação consciente para a ação, evitando se deixar levar por “impulsos instintivos e violentos”. Esse “bom senso” é o que Gramsci chamou de “núcleo sadio do senso comum”. Ou seja, mesmo no nível do senso comum é possível refletir, pensar de maneira crítica sobre a realidade, tomar consciência dela e agir de modo coerente com essa consciência. E isso, de certo modo, já é “filosofar”, pelo menos um filosofar ao nível do senso comum. De fato, não é raro vermos pessoas simples, às vezes com pouca ou nenhuma escolaridade, que revelam um entendimento aguçado e bem elaborado da realidade em que vivem.

A religião
Finalmente, a Filosofia está presente na religião porque também na experiência religiosa nos deparamos com questões e conceitos (Deus, alma, morte etc.) que foram e continuam sendo objeto da reflexão e da elaboração dos filósofos.
Portanto, se a Filosofia está contida na linguagem, no senso comum, no bom senso e na religião, podemos dizer então que ela está presente em todas as dimensões da vida humana, sendo, portanto, familiar a todas as pessoas. Afinal, toda atividade humana, mesmo aquelas que são predominantemente práticas (as diversas formas de trabalho manual, por exemplo), é sempre acompanhada de um pensar, de um saber, em suma, de um trabalho intelectual, racional, reflexivo. É nesse sentido que podemos afirmar que “todos os homens são ‘filósofos’”.

Filósofos e “filósofos”
Se “todos os homens são ‘filósofos’”, como quer Gramsci, qual é, então, a diferença entre o filosofar de uma pessoa comum e o de um filósofo profissional ou especialista? O próprio autor esclarece: “O filósofo profissional ou técnico não só ‘pensa’ com maior rigor lógico, com maior coerência, com maior espírito de sistema do que os outros homens, mas conhece toda a história do pensamento, isto é, sabe as razões do desenvolvimento que o pensamento sofreu até ele e está em condições de retomar os problemas a partir do ponto em que eles se encontram após terem sofrido a mais alta tentativa de solução etc. Ele tem, no campo do pensamento, a mesma função que nos diversos campos científicos têm os especialistas”.

Em outras palavras, podemos dizer que o filósofo especialista: pensa, reflete, raciocina observando mais cuidadosamente as regras da lógica e os procedimentos metodológicos que utiliza; conhece a história do pensamento, isto é, a história da Filosofia; é capaz de analisar os problemas de seu tempo à luz da contribuição dos filósofos do passado que já se debruçaram sobre eles.

Mas se existe essa diferença entre o filósofo especialista e o não especialista, por que então afirmar que “todos os homens são ‘filósofos’”? Justamente para combater e destruir aquele preconceito de que a Filosofia é uma atividade muito difícil e restrita a uma minoria. É importante perceber que a propagação desse preconceito cumpre uma função política conservadora, na medida em que afasta a Filosofia do contato com as massas, com o povo, com as pessoas mais simples. Dessa forma, impedidas de se apropriar dos conceitos e das teorias elaboradas pelos filósofos, as pessoas ficam desprovidas dessas ferramentas intelectuais que lhes permitiriam superar mais facilmente o senso comum e adquirir um conhecimento mais crítico e elaborado da realidade em que vivem.

Além disso, cabe afirmar que todos os homens são “filósofos” para deixar claro que todas as pessoas são potencialmente capazes de avançar de um “filosofar” espontâneo, assistemático, restrito ao bom senso, para um filosofar mais elaborado e rigoroso, semelhante ao praticado pelos filósofos especialistas.


Referências Bibliográficas:

GRAMSCI, A. Caderno 11 (1932-1933). Introdução ao estudo da Filosofia. In: Cadernos do cárcere. Vol.1. Edição Carlos Nelson Coutinho com Marco Aurélio Nogueira e Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 410.
MATERIAL DE APOIO AO CURRÍCULO DO ESTADO DE SÃO PAULO CADERNO DO PROFESSOR FILOSOFIA ENSINO MÉDIO 3ª SÉRIE VOLUME 1. Texto Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola.

quinta-feira, 7 de maio de 2020

SÓCRATES - Conhece a ti mesmo


Será que conhecemos verdadeiramente o que acreditamos conhecer?

Contexto histórico

O século de Péricles

      Sócrates (470-399 a.C) nasceu numa época em que Atenas se tornava uma potência política, econômica e militar, a cidade Estado hegemônica da Grécia. Nasceu no chamado “século de Péricles”, que passou a governar Atenas quando Sócrates tinha vinte anos de idade. O século que viu nascer foi o chamado “século de ouro”, “época das luzes”, o “milagre grego”, sem similar na história do mundo ocidental. A democracia já era uma realidade desde que Clístenes introduzira suas reformas. Atenas era uma cidade florescente.

Mesmo tendo sido muitas vezes incluído entre os sofistas, Sócrates recusava tal classificação e opunha-se a eles de forma crítica. Opunha-se, igualmente, aos poderosos de seu tempo, sendo acusado de não crer nos deuses da cidade e corromper a juventude. Por isso, foi condenado e morto. O pensamento de Sócrates que predominantemente chegou até nos foi transmitido por Platão.


         Quem foi Sócrates

Busto de Sócrates

          Sócrates foi filho de Sofronisco, um escultor e Fenareta, uma parteira. Nasceu em Atenas, onde passou toda sua vida. Sócrates é considerado um marco divisório na história da filosofia grega. Por isso, os filósofos que o antecederam são chamados de Pré-Socráticos e os que o sucederam, de Pós-Socráticos. O próprio Sócrates, porém, não deixou nada escrito. O que se sabe dele e de seu pensamento vem dos textos de seus discípulos e de seus adversários. A popularidade de Sócrates em Atenas era decorrente de sua atitude em relação à filosofia: Sócrates percorria a cidade com frequência dialogando com os jovens e adultos nos espaços públicos. Essa atividade, aliás, era condizente com a cultura ateniense da época, afinal a democracia se fundamentava justamente nos debates públicos.



A verdade e a felicidade em Sócrates

            Para Sócrates a procura pela verdade implicava em conseguir uma convivência honesta e digna entre os homens. Para ele conhecer a verdade teria como consequência inevitável agir bem, quanto aos maus atos, só seriam cometidos por ignorância. O bem e a verdade estariam intimamente ligados, seriam inseparáveis, conhecer seria igual a conhecer o bem. Agir conforme o bem seria decorrência do conhecimento. Pelo mesmo raciocínio, uma ação danosa a si ou a outros seria decorrência do desconhecimento, da ignorância.
            De acordo com o pensamento de Sócrates, a finalidade da vida é a felicidade, que estaria na capacidade do ser humano em estabelecer para si mesmo, por meio do saber, suas próprias leis e regras de condutas (de como agir).


O Método Socrático: a dialética e a arte de perguntar

Ironia: No início dos diálogos, Sócrates costumava apresentar-se como quem deseja aprender com que estava conversando, fazendo-lhe perguntas, uma atrás da outra. Por isso, essa primeira parte é chamada também de ironia, palavra que significa “interrogação fingindo ignorância”.

        Com habilidade de raciocínio, no entanto, conduz suas questões de forma a evidenciar as contradições e os problemas que surgem a cada resposta de seu interlocutor. Desse modo vai refutando, negando, contestando as concepções que o outro tinha sobre determinado assunto e, ao mesmo tempo, demolindo seu orgulho, sua arrogância e sua presunção de saber. A primeira virtude do sábio é adquirir consciência da própria ignorância. “Só sei que nada sei”.

Maiêutica: Na segunda etapa do diálogo, liberto do orgulho e da pretensão de que tudo sabe, o interlocutor já está em condições de iniciar o caminho de reconstrução de suas próprias ideias. Novamente Sócrates lhe propõe, com grande habilidade, uma série de questões, ajudando-o a trazê-las à luz. Por isso, essa fase do diálogo socrático é chamada de maiêutica, palavra que significa “arte de ajudar a dar á luz, a parir”.

           Não sei se o leitor observou, mas o Método Socrático tem uma inspiração nos pais dele. Sócrates era filho de um escultor e de uma parteira, o que o levou a buscar esculpir, simbolicamente, uma representação autêntica do ser humano e a ajudar seus discípulos a dar à luz suas próprias ideias.

           
A morte de Sócrates

A morte de Sócrates


           Sócrates não dava importância à condição socioeconômica de seus discípulos. Dialogava com ricos e pobres, cidadãos e escravos. O que importava eram as qualidades interiores de cada pessoa, condições indispensáveis ao processo de autoconhecimento.

   Como não fazia distinção entre seus interlocutores e questionava tudo, incluindo crenças e valores comuns, foi considerado uma ameaça social, um subversivo. Interessado na prática da virtude e na busca da verdade, contrariava os valores dominantes da sociedade ateniense. Por isso, recebeu a acusação de ser injusto com os deuses da cidade e de corromper a juventude. No final do processo, em 399 a.C., foi condenado a beber cicuta, um veneno letal extraído de uma planta de mesmo nome.

        Foi então, concedida a chance de escapar da pena se renegasse suas ideias diante do tribunal, ao mesmo tempo em que alguns amigos arquitetaram um plano para que ele fugisse de Atenas. Entretanto, Sócrates não aceitou nenhuma das alternativas, ambas desonrosas do seu ponto de vista e foi morto por meio da ingestão do veneno. Nesta ocasião, Sócrates teria dito uma frase que ficou famosa: “Uma vida vivida sem reflexão (filosofia) não vale a pena ser vivida”. Diante dos juízes, Sócrates assumiu uma postura altaneira e imperturbável, de quem nada teme. Permanecia absolutamente em paz com sua própria consciência.

(Para saber mais sobre a morte de Sócrates, leia, neste mesmo blog, uma publicação com o título “Cicuta Mortal”).


Questões para reflexão:

1) Explique com suas palavras o que é a Ironia e Maiêutica, procedimentos utilizados por Sócrates para chegar ao conhecimento verdadeiro.

2) Por que, para Sócrates, agir bem ou fazer o bem, estava ligado ao conhecimento?

3) “Só sei que nada sei”, frase atribuída a Sócrates, é aparentemente contraditória. Qual a importância desse princípio nas ideias defendidas pelo filósofo?

4) O que Sócrates fez para ser considerado um elemento perturbador da democracia ateniense?

5-) Por que é possível dizer que a condenação de Sócrates teve um motivo político?

Referência

CHALITA, Gabriel. Vivendo a Filosofia. São Paulo: Atual, 2002. (p.46-49)
COTRIM, Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. 4ªed. São Paulo: Saraiva, 2016. (p.222)
MEIER. Celito. Filosofia: por uma experiência da complexidade. Volume único. 2ª Ed. Belo Horizonte: MG; Pax Editora e Distribuidora, 2014 (p.101)

Imagem 1 Péricles: 
Imagem 2 Sócrates:
Imagem 3 Os três filtros de Sócrates:
Imagem 4 A morte de Sócrates: